Os Miseráveis, filme do inverno
Sobre nos reconectar com as verdadeiras riquezas e verdadeiros enganos que fazem a miséria permanecer presente na alma humana.
Todos os invernos eu assisto ao musical Os Miseráveis, versão de 2013 com a Anne Hathaway e Hugh Jackman. Estive no lançamento desse filme, sessão de estreia. Desde lá, eu o assisto com insistência. É sem dúvida o filme que assisti mais vezes na vida.
// geralmente é preciso alugar em algum dos sistemas de streaming, nem sempre está disponível. Esse ano aluguei pelo Prime.
Comecei a assistir em todos os invernos por volta de 2018. Não me recordo ao certo quando meu ritual de passagem começou. Oficializei que todos os anos eu voltaria a essas cenas. Isso para que eu não me esqueça das tantas misérias que habitam em nossa alma humana.
A miséria se instala em nós de muitas formas, sob muitas caras. Carências. Medos. Mentiras. Ganâncias. Roubos. Egoísmo. Orgulho. Cegueiras. Valores distorcidos. Sinto dizer: se você acredita que não tem em si misérias, está cego em meio ao tiroteio.
Quem não encara a própria miséria se esquece que ainda há muito a aperfeiçoar e se distrai da missão dessa vida que é desenvolver virtudes. Não é não errar. Não é ser bonzinho. Não é fazer tudo certo. Não é só ganhar nota azul no boletim da vida. A grandeza e a riqueza dessa vida está no partilhar, no servir, no doar-se com o coração. Essa é nossa tarefa diária. A tarefa cena a cena.
Essa época que me preparo para a Travessia de Inverno do Espírito Selvagem a melhor maneira de aquecer minha alma para o frio que vem - e esse ano realmente estou num frio brabo aqui em Curitiba - é despertar aquilo que há de verdadeiro e lapidar o que há de falto. Misérias são sempre consequência da desconexão da alma com a Grande Fonte.
As Partes do Filme e Suas Sabedorias
Todos os anos eu faço algumas anotações do que me chamou a atenção no filme. Esse ano eu fiz de uma forma dividindo o filme em partes. Dei um título a cada uma delas e selecionei alguns trechos marcantes. O que quero compartilhar aqui é um desenrolar que pode nos servir de mapa para a saída da miséria para a riqueza.
Onde está a miséria?
Quando pensamos em miséria, podemos visualizar o mendigo. Aquele que precisa estender suas mãos pedindo auxílio, algumas moedas, pois não enxerga que tem em si o valor e a força de realizar riquezas. O mendigo representa aquele que perdeu as esperanças sobre o seu valor.
A história de Os Miseráveis acontecem num contexto de Revolução Francesa, quando as ruas estão tomadas de pedintes clamando por comida. Quando os pobres pedintes cantam sua canção, dizem “ninguém tem nada a dar a ninguém”.
E eis aqui a chave para entender todas as outras misérias retratadas o filme, que não é somente sobre os mendigos e pedintes, mas sobre o homem quando ganancioso, o homem quando nega estender sua mão para ajudar, o homem quando erra em seus julgamentos, o homem quando se perde do verdadeiro Senhor, o homem quando nega ajuda, o homem quando desonesto, o homem quando se compara e se coloca em posição de inferioridade, o homem que é vingativo.
Essas são apenas algumas nuances. A cada vez que assisto ao filme novas nuances da miséria se apresenta para mim.
A miséria continuará instalada em nós enquanto não nos percebermos parte de um grande todo conectados a uma única fonte divina. Há um longo caminho pela frente.
Onde está a riqueza?
Da mesma maneira que esse filme é uma pérola para percebermos o que é a miséria, também ele nos brinda com o que é a riqueza.
Muitas cenas emocionam o nosso coração pela beleza do humano em sua plenitude. A benevolência. A gentileza. A lealdade. O entregar a vida em amor. O confiar na providência divina. A gratidão. O ato de confiar na grandeza do outro. A misericórdia.
Onde há riqueza verdadeira, nosso coração se acende de uma emoção muito pura e humana, algo que demonstra pela pureza da nossa emoção que há uma Verdade Maior ali. A virtude se apresenta dessa forma, por essa emoção que coloca nosso coração em chamas e destaca o que é Bom, Belo e Justo.
“Quem Sou Eu?”
De tantas maneiras esse questionamento se faz presente como tema central do filme. “Quem Sou Eu?”, eu sou o miserável ou eu sou o rico? Eu sou pobre em meu espírito ou sou rico com a minha fonte?
Essa resposta vai sendo tecida ao longo de todo o filme - assim como é tecida ao longo de toda a nossa vida - quando escolhemos por caminhos que nos elevam ou por caminhos que deterioram nosso espírito.
Os valores humanos baseados no compartilhar, no somar, no confiar no divino, na lealdade, na justiça de Deus, na misericórdia, tudo isso nos eleva e aponta para cima. Há um momento em que Jean Valjean, o personagem central que faz todo o trabalho em nosso coração, vive um dilema moral em que pode escolher entre se prejudicar e permitir que um outro desconhecido prejudique-se em seu lugar. E ele reflete: “se eu me calar, serei amaldiçoado. Minha alma foi entregue nas mãos de Deus há muito tempo”. Que postura.
Jean Valjean, de condenado com título de homem perigoso por ter roubado um pão para alimentar sua família em um inverno duro, se torna ao longo do filme num verdadeiro JUSTO - expressão usada pelos cabalistas para se referir aquele que completou sua vida de forma empenhada a se manter alinhado à Lei de D’us.
O justo é rico. O justo é a pura expressão da riqueza. O justo tem o coração cheio. O justo sabe que fez o bom caminho.
A Revolução
A Revolução Francesa tem como pilar a Liberdade, a Igualdade e a Fraternidade. Eis as riquezas em sua essência. Não é sobre nos darem liberdade, é sobre podermos escolher agir como ricos ou como pobres na cena que se põe aqui e agora. Não é sobre nos tratarem com igualdade, é sobre vermos a nós mesmos e também ao outro como imagem e semelhança também de Deus. Não é sobre o governo ser fraterno, é sobre as pessoas se unirem como irmandade e somarem forças, compartilhando e servindo com o seu melhor.
Nosso egoísmo e orgulho impedem tudo isso. Seguimos querendo aparecer mais que o outro, sermos mais valorizados que os outros, termos mais riquezas aparentes que os outros, concorrendo, disputando espaço e atenção, estando em comunidade e querendo só receber ao invés de compartilhar.
Desejo que essas linhas sejam por aí instrumento de despertar das riquezas dentro de você e um convite para que também assista - observe que eu não usei a palavra “rever” de propósito, pois todas as vezes que assisto a esse filme limpo meus olhos para que eu esteja o vendo pela primeira vez.
Bom inverno a todos nós,
Que reflexão mais linda que você nos trouxe, Paula querida.
Realmente a grandeza e a riqueza dessa vida está no partilhar, no servir com seu melhor, no doar-se com o nosso coração.
O quanto nossa alma está desconectada da Grande Fonte? É essencial que nos percebamos parte desse grande todo conectados a uma única fonte divina.
Que bonito quando você traz esse coração em chamas e a importância de nos elevarmos dia a dia ao que é Bom, Belo e Justo.
Que possamos ser esse verdadeiro justo que tem o coração cheio. Nossa, como isso me tocou!
Egoísmo e orgulho infelizmente muito presentes na sociedade. Precisamos estar atentos a não cair neles. E se cairmos, levantarmos e continuarmos nossa jornada.
Como você nos traz instrumentos relevantes para que possamos despertar as riquezas em nós ☺️
Um abraço grandão para vc 😘